quinta-feira, 9 de outubro de 2008

O ocaso de Maia e o acaso de Maria

por Jota Ninos (*)

A política, como a economia, vive de ciclos. Em Santarém, essa realidade se comprova a cada eleição municipal. Me detenho a falar somente dos ciclos que vivenciei e acompanhei como agente político ou como jornalista, já que os mais antigos precisariam de um estudo mais profundo em documentos que nem sei se existem (nossa história local ainda precisa sair da narrativa em formato de “diário pessoal”, para a pesquisa científico-acadêmica).

Entre o fim do período ditatorial (quando Santarém foi área de segurança nacional e não pôde mais eleger prefeitos) e o período pós-Collor, vivemos o ciclo que eu costumo chamar de “Ron-Ron”, quando Ronan Liberal e Ronaldo Campos alternaram-se na prefeitura durante dez anos lutando um contra o outro ou os dois juntos contra todos.

A linha tênue de suas diferenças estava entre o frisson demagógico-populista de um e a exacerbação despótico-demagógica do outro, o que os fez serem duas faces de uma mesma moeda que um dia perdeu o brilho. Hoje, um prepara o filho para um vôo político no futuro e o outro vagueia feito fantasma tentando sempre uma vaga na Câmara Municipal, ou pelo menos uma assessoria de esmola de quem estiver no poder. Ao final dos ciclos políticos há sempre o ocaso de uma ou mais lideranças que a ele pertencem.

Após o ciclo “Ron-Ron”, vivemos a transição do governo de Ruy Corrêa que serviu para preparar o terreno para um novo ciclo. Como na agricultura, era preciso “descansar a terra”, para novamente plantar algo de novo. Mas o novo veio com cara de coisa antiga.

De um lado Lira Maia, político da mesma linhagem de Ronaldo Campos (e cria dele), “adubado” na credibilidade tecnicista de Alexandre Von, jovem de futuro promissor. Do outro lado, a filha de um prefeito considerado dos mais populares e ela com uma carreira no Ministério Público, adubada pela experiência política de um irmão centralizador e de um partido de raízes populares, o PT.

O confronto dos dois projetos vai completar um ciclo de 16 anos ao final do segundo mandato de Maria conquistado nas urnas no domingo passado, sendo que os três últimos prefeitos antes de Maia se alinharam à Maria.(…)

Este pode ser o início do ocaso de Lira Maia, que depois de dois mandatos na prefeitura e experiência legislativa acumulada, amargou uma derrota anunciada que ele mesmo anteviu no meio da campanha e por isso mesmo insuflou seus comandados à barbárie e ao jogo sujo de panfletos apócrifos, que pareciam ter ficado no passado de seu mentor. Era uma derradeira tentativa de diminuir a traulitada na cabeça que parecia iminente. Mas nem as pesquisas de ponta a cabeça deram certo (que me perdoe o irmão e parceiro de sempre, Dornélio Silva, da Perspectiva).

O velho espírito animalesco de Ronaldo Campos, de Benedito Guimarães e de outras figuras políticas do passado ressuscitou na eleição deste ano em forma de ataques virulentos e provocações em busca de sangue. O mentor de Maia, já decrépito, estrilava contra o aluno nos palanques de Maria com a velha verborragia de sempre. Um de seus irmãos, enquanto isso, ficava do lado de lá apupando petistas acuados em seu QG de campanha.

Lira Maia não vai digerir bem essa derrota. Vai usar de todas as suas forças para minimizar o prejuízo, e será o torcedor da primeira fila por um governo-desastre de Maria, que possa suavizar seu ocaso. Entretanto, mesmo que Maria faça um governo tão inepto, em alguns aspectos, que o primeiro (muitas ações até que aconteceram, mas pouco se soube ou pouco se pôde valorizar antes da campanha), o caso de Maia é irremediável.

Vi Maia na TV e ele já não consegue passar a credibilidade que passava durante seu governo. Não foi só erro de seus “marketeiros” de tentar produzir um Maia de estúdio, tirando-lhe a maior arma: a espontaneidade. Mesmo que tentasse ser espontâneo, Maia mal conseguiria ser digno. O eleitor percebeu isso.

Se de um lado há o ocaso de um líder (ainda em ebulição), do outro temos o acaso de uma liderança turbinada por um carisma indescritível. Entretanto, não se faz um líder só de carisma. Maria precisará desanuviar de vez a dependência que seu governo tem da mão forte de Everaldo Martins Filho, que diga-se por sinal é vital para que o governo siga em frente, mas pode ser prejudicial quando passa do tom.

Da mesma forma que convivi nos bastidores do PT, como militante, em seu início e da mesma forma que trabalhei no marketing de Maia, nas últimas semanas de campanha pude conviver de perto com a campanha de Maria, contratado como consultor.

Vi de perto que o carisma de Maria, aliado à mão forte de Everaldo, conta com o esteio de pessoas mais sensatas como Socorro Pena (a velha guerreira dos tempos do PT não perdeu o charme e sabe lidar com crises) e Carlos Martins, o deputado estadual que passa a serenidade necessária para que um novo projeto se alinhave.

Mas a figura de Maria não estará mais no contexto local na próxima eleição, assim como Maia, que se for mais esperto do que foi nessa campanha não se arriscará a uma nova derrota.

A próxima eleição municipal deve dar início a um novo ciclo político, onde os Maia e os Martins poderão ser coadjuvantes (ou não). A eleição de 2012 será ainda mais emblemática já que deverá ter dois turnos, fazendo com que os projetos passem por dois filtros, mas até lá há ainda um corredor polonês chamado 2010, quando o Brasil saberá o quanto Lula tem poder e o quanto o PT sobreviverá sem ele.

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